sábado, 4 de abril de 2009

Perto de Cinco Quinas de um Castelo

Recebeu diversas distinções pela sua escrita e a vida trouxe-o a este mundo numa terra incrustada para as bandas da raia de Espanha, onde os barrocos decoram a paisagem, assim como o pinheirame. Num lugar de destaque, ergue-se o castelo, encimado por cinco quinas, que o tornam único em Portugal. Manuel António Pina nasceu em 1943 na agora cidade do Sabugal, onde viveu até aos seis anos, tecendo recordações que, no seu dizer, vêm povoar os seus poemas.
Da terra diz:

A recordação mais antiga que tenho de mim mesmo (falei dela há tempos numa entrevista a uma revista da Galiza) é uma criança de dois ou três anos, de chapéu de palha na cabeça, ao pé de uma fonte, acho que uma fonte de mergulho, circular, num largo talvez em frente de minha casa. Outra criança tira-me o chapéu da cabeça e atira-o à água. Eu – acho que sou eu essa criança – exijo-lhe que o vá buscar e mo devolva. O outro miúdo não o faz, e afasta-se rindo. Então, cheio de orgulho ferido, eu regresso a casa.
Hoje, essa mesma terra presta-lhe homenagem numa tarde que se adivinha acolhedora, como a mãe que abraça o filho crescido, que acaba de regressar.

A avó


Tinha ao colo o gato velho

cansadamente passando
a sua branca mão pelo

pêlo dele preto e brando


Sentada ao pé da janela
olhando a rua ou sonhando-a

todo o passado passando

a passos lentos por ela


Dormiam ambos enquanto

a tarde se ia acabando

o gato dormindo por fora

a avó dormindo por dentro


In Os Livros (2003)


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